sábado, 27 de outubro de 2018

Uma carta a Carlos Drummond de Andrade

sábado, outubro 27, 2018 8

Querido Carlos,

perdoe-me a intimidade de chamá-lo pelo primeiro nome. Acontece que não gosto de formalidades e, me parece, você também não. Ademais, quero conversar sobre o que anda transbordando do peito e isso também não combina com cerimonialismos.

Estava aqui pensando quando nos conhecemos e como foi o nosso primeiro encontro. Não consegui me lembrar ao certo, mas creio que isso aconteceu em uma sala de aula, há 17 anos. O poema que trazia as suas sete faces me despertou o desejo de entender mais da crítica literária e de querer esmiuçar cada verso, para lhe conhecer melhor. Dali, pulamos para "No meio do Caminho", "Quadrilha" e "Sentimento do mundo". Foi com "Sentimento do mundo" que você ganhou meu coração. Você mora nele até hoje.

Trecho de abertura do poema "Sentimento do Mundo", de Carlos Drummond de Andrade.
Alguns amigos lhe reconhecem no que eu escrevo, mesmo que eu não esteja pensando em você no momento da escrita. De algum modo mágico, seu texto se entranhou nas minhas veias. As crônicas, os poemas, o seu modo intenso de ver o mundo com uma simplicidade dolorosa... Não sei se aprendi com você a ser assim, ou se me reconheci em você justamente porque sou assim.

A resposta para esse dilema não importa. A confluência, sim. Principalmente quando ela é do amor. Tenho fé nas pessoas, Carlos, e não quero perdê-la. O mundo está de pernas para o ar; mas, ainda assim, quero manter fé nas pessoas. E é por isso também que lhe escrevo.

Carlinhos, você viveu o horror de presenciar as duas grandes guerras. Você também viu o que veio depois delas. Então, Carlos, me diga, como lidar com tanta gente se odiando? Como educar, como escrever, como encontrar forças para vencer o medo e o ódio que se espalham pelas ruas e ganham cada vez mais força? Como viver em uma sociedade que está polarizada? (Sim, de novo, Carlos. Em outro contexto decerto; contudo, aqui estamos nós, cada um de um lado.)

Poema "Congresso Internacional do Medo", de Carlos Drummond de Andrade.

Carlos, a amendoeira falou enquanto seus netos brincavam na praça. Será que voltarei a ver esta paz reinando novamente? Será que, de algum modo, a humanidade aprenderá com os seus erros e terá paz algum dia? Será que o José encontrará um consolo para o seu e agora?

Trecho do poema "As Sem-Razões do Amor", de Carlos Drummond de Andrade.

São muitas perguntas sem respostas, Drummonzinho. Muitas mesmo. De qualquer modo, por mais que eu conserve este nó no peito, quero lhe agradecer: suas crônicas e seus poemas sempre foram e sempre serão um abraço em meio ao caos.

Com carinho,
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sexta-feira, 19 de outubro de 2018

{Vou por aí} Parque Villa-Lobos, em São Paulo

sexta-feira, outubro 19, 2018 14
Conheça um pouco do Parque Villa-Lobos, em São Paulo.
Olá, pessoal!
O post de hoje é para contar um pouco sobre um dos pontos de lazer da minha cidade, o Parque Villa-Lobos, localizado na zona oeste de São Paulo.

O parque é composto por uma área verde em que é possível fazer piquenique, caminhadas, ler, fotografar, levar o cachorro para passear e descansar. Além dela, há um orquidário, uma horta com mudinhas, quadras de basquete, de futebol e de tênis e a biblioteca, meu local preferido.

O lugar também é muito agradável para quem gosta de andar de bicicleta, de skate e de patins.

Espaço Vida. ♥
Ao longo de todo o parque é possível encontrar banheiros públicos, bebedouros e barraquinhas que vendem comidas (pastel e churros foram as que me chamaram atenção) e bebidas (7 reais a água de coco natural. Sinalizo isso, porque acho a água de coco industrializada muito ruim!).

Água para os doguinhos.*_*


Entrada do Orquidário Ruth Cardoso.
Foto: Patricia Rodrigues.


Segundo o site oficial,
O parque, que abrange uma área de 732 mil m², possui ciclovia, quadras, campos de futebol, “playground” e bosque com espécies de Mata Atlântica. A área de lazer inclui ainda aparelhos para ginástica, pista de cooper, tabelas de “street basketball” e um anfiteatro aberto com 750 lugares, sanitários adaptados para deficientes físicos e lanchonete.
Estima-se que durante a semana cerca de 8 mil pessoas passem a cada dia pelo Parque. Aos finais de semana recebe cerca de 50 mil visitantes e aos feriados 60 mil.
They're playing basketball, we love that basketball

A biblioteca

Fachada da Biblioteca Villa-Lobos.
Foto: Patricia Rodrigues.

Falando especificamente da biblioteca (BVL), ela é muito acolhedora e tem um acervo diversificado — não apenas de livros. Lá há uma gibiteca, uma área de jogos de tabuleiro, de vídeo-game, de computadores para pesquisa. Além disso, há um acervo específico para deficientes visuais, com audiolivros e livros em braile. 

Imagem: Patricia Rodrigues.

O prédio da biblioteca é todo acessível, contando com elevadores para quem tem a mobilidade reduzida e sinalizações em braile para quem é deficiente visual.

Esta é a parte dos livros em braile. Na imagem, seguro uma versão do A visita cruel do tempo, da Jennifer Egan, um dos meus livros preferidos. | Leia a resenha deste livro aqui. | Imagem: Patricia Rodrigues.

Tanto a programação quanto o acervo é integrado com o da Biblioteca de São Paulo, localizada no Carandiru, na zona norte da cidade.

Endereço

Futebol antes do parque fechar.

Av. Professor Fonseca Rodrigues, 2001
Alto dos Pinheiros – São Paulo – SP
CEP: 05461-010
Tel.: 11 – 2683.6302
Funcionamento: De segunda a segunda das 5h30 às 19h.
No horário de verão, até às 20h.
Clique aqui para acessar o site do parque. | Clique aqui para acessar o site da Biblioteca Villa-Lobos.
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segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Uma potência em mim

segunda-feira, outubro 15, 2018 4
Imagem: pexels.
Escrevo numa tentativa de recompor a minha liberdade. Às vezes, eu a sinto ameaçada de tal forma, que parece que eu a prendo pelo pescoço no alto de uma árvore. Quando o apoio dos pés estão prestes a falhar, escrevo.

Este momento não é sempre tão claro. A necessidade emerge nas horas mais inóspitas, ganhando uma força que nem mesmo reconheço. Esta potência mora, um tanto adormecida, dentro de mim e ganha asas por meio das palavras que escrevo.

Não planejo a minha escrita. Ela surge, simples e pura, à minha frente, berrando para que lhe dê vida. Pulsando até que as ideias apareçam — no papel ou na tela — e sejam lidas por outrem. Fisgadas pelas entrelinhas, o texto ganha forma. Não há controle ao longo do processo, mas há beleza. E o que é a arte se não algo belo em sua estranheza?

Tudo parece mágico, eu sei, e a verdade é vital: escrever é o que mantém a minha sanidade e é o que marca a minha existência no mundo.

Não sei até que ponto isso reverbera nos outros. Só sei que sou livre, sou luta, sou assim.
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sábado, 13 de outubro de 2018

{Resenha} Crônicas para jovens: de escrita e vida, de Clarice Lispector

sábado, outubro 13, 2018 0
De escrita e vida.
Crônicas para jovens: de escrita e vida reúne trechos de diversas crônicas da escritora Clarice Lispector e serve como um bate-papo gostoso entre ela e seu leitor, em que ambos refletem sobre o fazer literário e as pequenas nuances do dia a dia. E é ótima para quem deseja fazer um primeiro contato com a literatura da autora.

"Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever também é abençoar uma vida que não foi abençoada". (Clarice Lispector)

Nesses textos, vemos uma Clarice longe dos pedestais que os leitores, a mídia e os literatos a colocaram. Ali está uma escritora que quer apenas organizar seus pensamentos, ganhar um pouco de dinheiro e criar os filhos com amor. E é justamente por isso que conseguimos sentir de fato como era a sua ligação com a escrita e o quanto a literatura lhe era necessária.

Clarice Lispector.

O que mais gostei no livro é que a Clarice tinha uma visão muito clara de que literatura é literatura e ponto. Em nenhum momento ela via a literatura infantil menor do que a adulta. Pelo o contrário, o que lhe causa estranhamento é justamente a distinção feita pelo público que sempre lhe pergunta porque os escritos para crianças são mais fáceis.

De Escrita e Vida, por Clarice Lispector — página 79.

Outro ponto interessante é a forma como ela reflete o diferente tipo de escrita. Para Clarice era claro que escrever uma crônica ou um conto é muito distinto de escrever um romance. Em alguns momentos esses processos eram vistos como maldição, em outros, como a única possibilidade de salvação.

Como escrever? Esta é uma resposta difícil de ser dada até por alguém com a magnitude de Clarice Lispector. Enquanto ela buscava um meio de nos responder, nós ganhávamos o presente: sua literatura.

"Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não palavra — a entrelinha — morde a isca, alguma coisa se escreveu". (Clarice Lispector)

Livro: Crônicas para jovens: de escrita e vida
Autora: Clarice Lispector
Editora: Rocco Jovens Leitores
Páginas: 144
Sinopse: Para Clarice Lispector escrita e vida eram as duas faces de um mesmo milagre: a vida cotidiana. Nesta seleta de reflexões sobre a escrita e o ato de escrever, extraídas de suas crônicas, alguns poderão encontrar as chaves para a compreensão das motivações profundas de sua obra. Ao passo que outros encontrarão certamente estímulo para escrever e, assim, adensar a história de suas próprias vidas. De escrita e vida não ilumina apenas a produção literária e a existência de Clarice, lançando também um esclarecedor foco de luz sobre as vidas dos próprios leitores.
Livro no Skoob.

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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

8 livros para celebrar o dia das crianças

quinta-feira, outubro 11, 2018 3
Feliz dia das crianças! Feliz dia nacional da leitura! 
Oi, pessoal!
Amanhã, 12 de outubro, é o Dia das Crianças e o Dia Nacional da Leitura. Sendo assim, resolvi juntar a minha paixão pelos livros e as duas festividades para indicar sete obras para ler com os pequenos. A exceção de Shel Silverstein e da Malala Yousafzai, todos os outros autores do post são brasileiros. Viva à nossa criatividade! E boa leitura!

Fonte: Companhia das Letras.
Livro: Coisa de Menina (leia a resenha deste livro)
Autora/ilustradora: Pri Ferrari
Editora: Companhia das Letrinhas
Sinopse: O que é coisa de menina? Oras, isso é algo que toda menina (e todo menino) deveria saber muito bem. Afinal, é na infância que a gente percebe que não existe regra e que todo mundo pode tudo: tem menino que gosta de brincar de casinha, tem menina que gosta de construir foguete. Por que, então, temos que nos adaptar a certos padrões de comportamento? Por que ainda dizem por aí que certas coisas não são apropriadas para mulheres?
Este livro é para todos aqueles que acreditam na liberdade como a melhor escolha — e que têm certeza que meninas fizeram, fazem e farão muito mais.

Livro: Coisa de Menino
Autora/ilustradora: Pri Ferrari
Editora: Companhia das Letrinhas
Sinopse: O que é coisa de menino? Tem menino que deseja ser super-herói, jogador de futebol e astronauta. Outros sonham em ser estrelas do rock e viajar o mundo cantando para multidões. Mas todos eles também podem querer brincar de boneca, cozinhar receitas gostosas e fazer aulas de dança.
Muitos meninos crescem ouvindo que não podem agir e sentir da mesma forma que meninas — por que as coisas têm que ser assim? Este livro é para todos aqueles que acreditam que o importante é ter liberdade para fazer da vida o que se bem entender.

Livro: Caderno de Rimas do João
Autor: Lázaro Ramos
Ilustrador: Mauricio Negro
Editora: Pallas
Sinopse: Caderno de rimas do João é o primeiro livro do autor e ator Lázaro Ramos publicado pela Pallas Editora. O menino João encanta os leitores com rimas espontâneas e temáticas diversas. Ele nos apresenta, de um jeito divertido, os assuntos de um modo mais colorido. Além do texto escrito por Lázaro Ramos, O livro conta com as ilustrações do renomado Mauricio Negro. Uma combinação que só podia dar certo! Venha você também se encantar com as rimas do João!

Livro: Caderno sem Rimas da Maria
Autor: Lázaro Ramos
Ilustrador: Mauricio Negro
Editora: Pallas
Sinopse:Lázaro Ramos, ator muito conhecido de todos, se aventura em mais um livro infantil. Neste título chamado Caderno sem rimas da Maria, o autor se inspira em sua filha, inventa e ressignifica palavras e, nesta brincadeira, mostra que a liberdade da leitura nos faz viajar para lugares muito distantes.


Livro: O menino eu chovia (leia a resenha deste livro)

Autor: Cláudio Thebas
Ilustrador: Iran Zigg
Editora: Companhia das Letrinhas
Sinopse: Quem não conhece o menino que leva a bola do jogo para casa quando seu time está perdendo? E aquele que faz careta quando vê um prato de sopa ou torce o nariz quando a mãe põe na mesa a salada que faz tanto bem à saúde?
Pois o protagonista desta história era assim, só que ia muito além da cara feia: quando contrariado, quando ouvia um não, ele chovia. E não era qualquer chuvinha, não. Era temporal, tempestade, com raios e trovões de verdade. O pai, a mãe, os avós, a empregada, ninguém sabia o que fazer, ficavam todos apavorados, e todos tentando de tudo para o menino parar de chover. Um dia veio a gota d'água: ele simplesmente inundou a casa, e o que aconteceu é que a calamidade acabou sendo providencial. Foi ali, no meio da inundação, que os adultos encontraram a solução para o aguaceiro, para ajudar o menino mimado a ver o mundo com outros olhos e deixar a chuva só para os dias em que acordava muito mal-humorado.
Cláudio narra a história do menino das lágrimas sem usar em nenhum momento o verbo "chorar" ou o substantivo "choro". Ágil, divertida, sua narrativa em versos revela com sutileza todo o jogo de contradições emocionais que agita o cotidiano das personagens. O enredo se arma como uma seqüência de cenas curtas e expressivas, o que pode inspirar, em sala de aula, um bom exercício de teatralização.

Livro: O menino da Lua
Autor/ilustrador: Ziraldo
Editora: Melhoramentos
Sinopse: Ziraldo cria uma história surpreendente, no meio do sistema solar, onde o nada e o vazio cedem espaço às brincadeiras, às cambalhotas e a tudo aquilo que é eterno como a amizade. No livro O Menino da Lua, Ziraldo dá vida a uma turma de nove meninos, habitantes de cada um dos planetas. Este é o primeiro volume da série Os Meninos dos Planetas.



Livro: A Parte que Falta (leia a resenha deste livro)

Autor (texto e ilustrações): Shel Silverstein
Tradução: Alípio Correia de Franca Neto
Editora: Companhia das Letrinhas
Sinopse: O protagonista desta história é um ser circular que visivelmente não está completo: falta-lhe uma parte. E ele acredita que existe pelo mundo uma forma que vai completá-lo perfeitamente e que, quando estiver completo, vai se sentir feliz de vez. Então ele parte animado em uma jornada em busca de sua parte que falta. Mas, ao explorar o mundo, talvez perceba que a verdadeira felicidade não está no outro, mas dentro de nós mesmos.
Neste livro, leitores de todas as idades vão se deparar com questionamentos sobre o que é o amor e quanto dependemos de um relacionamento ou parceira para nos sentirmos plenamente felizes.

Livro: Malala e seu lápis mágico
Autor: Malala Yousafzai
Ilustrador: Kerascoët
Tradução: Lígia Azevedo
Sinopse: Quando era apenas uma menina vivendo no Paquistão, o maior desejo de Malala era ter um lápis mágico. Mas quando seu direito à educação foi colocado em perigo por homens que acreditavam que meninas não deveriam ir à escola, Malala percebeu que a sociedade em que vivia precisava de mudanças imediatas. Só então ela foi capaz de enfrentar grandes obstáculos até encontrar dentro de si a força e as ferramentas necessárias para mudar o mundo.
Em seu primeiro livro infantil, a garota paquistanesa ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, retorna à própria infância para apresentar sua história aos pequenos leitores e inspirar uma nova geração a quebrar o silêncio para transformar o mundo em um lugar melhor.

Vamos celebrar a literatura?!📖

Quer saber mais? A minha amiga e escritora, Aline Caixeta, escreveu uma lista com 7 livros para crianças corajosas. Clique aqui para acessá-la. 😉
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segunda-feira, 8 de outubro de 2018

{Resenha} 50 poemas de revolta, vários autores

segunda-feira, outubro 08, 2018 0
50 poemas de revolta.
Quando recebi o livro 50 poemas de revolta da Companhia das Letras, fiquei empolgadíssima com a seleção dos 34 poetas brasileiros que compõe esta coletânea. Sendo assim, coloquei o livro na bolsa e passei a carregá-lo para todos os lados, numa tentativa de devorá-lo. O que aconteceu, contudo, não foi bem assim.

Imagem: Companhia das Letras. Disponível na página 82.

Este não é um livro fácil. Ainda mais nos tempos em que a política brasileira anda confusa e raivosa, a sua leitura nos dá um soco no estômago e nos dói fundo na alma. Acabei fazendo a minha leitura aos poucos, digerindo cada palavra, cada letra ali escrita. A impressão que me passa é que muita coisa não mudou desde cada verso foi escrito — apenas piorou — porque o ódio, a ganância e a opressão relatados em cada poema continuam os mesmos.


Poema "Socorro", de Alice Ruiz. Páginas 26 e 27.
Organizado em três partes, a obra conta com um breve texto de apresentação escrito pelos editores, intitulado "Toda poesia é política?", que resgata um pouco da história da poesia de denúncia brasileira, contextualizando o leitor no tempo e no espaço. A segunda parte traz o conjunto de poemas propriamente dito. Com eles, percebemos que saímos da Segunda Guerra, mas as revoltas de cada verso nos provam que a guerra não saiu de nós. Vendo assim, 50 poemas de revolta nos serve de alerta para que a História não se repita, seja aqui no Brasil, seja em qualquer outro lugar. Por fim, temos os dados literários (uma minibiografia de cada autor, os livros em que os poemas foram publicados originalmente e um índice de títulos dos primeiros versos).

Poema "Alerta", de Oswald de Andrade, disponível na página 117. 


Apesar do desconforto e da dor, 50 poemas de revolta merece ser lido e espalhado por aí. Sua potência ajuda na luta por uma sociedade mais justa e menos furiosa.

Imagem: Companhia das Letras. Disponível na página 122.

Livro: 50 poemas de revolta
Autores: Adelaide Ivánova, Alice Ruiz, Ana Cristina Cesar, Angélica Freitas, Armando Freitas Filho, Bruna Beber, Cacaso, Carlos Drummond de Andrade, Carolina Maria de Jesus, Chacal, Claudia Roquette-Pinto, Conceição Evaristo, Fabiano Calixto, Fabrício Corsaletti, Ferreira Gullar, Francisco Alvim, Hilda Hilst, Horácio Costa, João Cabral de Melo Neto, Jorge de Lima, José Paulo Paes, Laura Liuzzi, Ledusha, Mário de Andrade, Nicolas Behr, Oswald de Andrade, Paulo Leminski, Roberto Piva, Tarso de Melo, Torquato Neto, Vinicius de Moraes, Waly Salomão, Yasmin Nigri e Zuca Sardan.
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 144
Sinopse: Nesta breve antologia, o leitor vai encontrar muitos motivos para se indignar. Desigualdade social, racismo, machismo, incontáveis modalidades de opressão e intolerância: esses são os temas tratados por 34 poetas brasileiros. Os poemas que compõem esta seleta por vezes revelam uma ponta de esperança; outras vezes, mergulhados em desgosto, levam o desânimo e a apatia às últimas consequências. Canônicos e novíssimos, os poetas abordam questões assombrosamente atuais e contundentes, mesmo quando parecem tratar de um passado distante. Escreve Hilda Hilst: “Repensemos a tarefa de pensar o mundo”.
Leia trecho disponibilizado pela editora. | Livro no Skoob.

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sábado, 6 de outubro de 2018

Sobre a violência que não quero viver

sábado, outubro 06, 2018 2
Registro da minha viagem a Belo Horizonte, feito pela minha amiga Karla.

Agora me pego aqui, me redescobrindo enquanto mulher, negra, filha e neta de nordestinos, tataraneta de indígenas, professora e escritora. Me pego aqui pensando qual é o meu lugar no mundo. Os últimos dias foram complicados e o nosso cenário político me faz pensar que, ao menos até o fim do mês, a tensão estará no ar.

Particularmente, não acredito que bandido bom é bandido morto (já não acreditava desde quando o Maluf defendia a “Rota na rua” como solução para a violência). Armar pessoas que estão furiosas só vai gerar mais fúria. Cada vez que vejo uma fechada no trânsito, um consumidor esquentadinho, um aluno ou um pai de aluno nervoso, penso se estaria viva caso eles tivessem uma arma em casa... No entanto, como professora sempre tive esperança nas pessoas (e por ter esperança, acredito que a Educação e condições de vida dignas — saúde, saneamento básico, alimentação e emprego — são o caminho). Também não acho que minha mãe, minha irmã, minhas amigas, minhas colegas de trabalho, minhas alunas e eu somos fruto de uma fraquejada. Ao contrário, quanto mais me cerco por mulheres, mais vejo a nossa força reverberar. Quanto mais estou com elas, mais me sinto forte. Por fim, não penso que meus amigos gays devam apanhar até morrer. Primeiro porque eles são pessoas maravilhosas; segundo - e mais importante - eu não quero que ninguém se meta na minha vida, nas minhas decisões e no meu corpo. Por que faria isso com eles? Sexualidade não define caráter.

É claro que ver a sociedade dividida é exaustivo. Vejo a mim e a quem me cerca cansados física e mentalmente. É cansativo, ainda que seja natural, após o esforço de pensar, de refletir, de checar informações (e, ao menos no meu caso, de ler tantos planos de governo). A nossa mente se sente exaurida. Tomar decisões que tenham impacto positivo, com tanta gente disseminando o ódio, é complexo mesmo.

Penso, contudo, que é importante que não entremos em pânico. Nossa democracia nunca esteve em um momento tão frágil, e ter serenidade para tomar a decisão mais adequada é fundamental. Quem deseja a violência como forma de governo, quer ver o restante da população instável. A sabedoria está justamente em não entrar nessa jogada.

Confesso que não costumo falar de política assim, abertamente, porque são poucas as pessoas que se predispõe a dialogar de fato — sem ofender ou sem cair no “evocêquismo”. Entretanto, sou escritora e a literatura também é um espaço democrático e político (que causa medo nos opressores, haja vista quem rasgou livros na biblioteca da UNB). Sendo assim, penso que não posso me omitir e aproveito para lembrar que uma discussão política não precisa, necessariamente, ser partidária.

A escolha do voto, feita de forma consciente, passa por um processo de autoconhecimento. Em um mundo cada vez mais rápido, em que as pessoas vivem no automático, essa escolha reflete em problema sociais. Se eu não sei exatamente o que quero, quais são os valores que considero importantes, o que desejo para a minha sociedade, como posso escolher alguém que me represente de fato?

Talvez seja por isso que vejo pessoas que considero (ou considerava) tão centradas optando por alguém que defende (ou que tenha um vice que defenda) a intolerância e a ditadura. Pode ser que essas pessoas tenham se perdido neste processo de se autoconhecer e de compreender que elas estão machucando e ferindo não apenas quem está ao redor delas, mas a elas próprias. De qualquer modo, quando a questão deixa de ser político-partidária para ser moral, fica difícil ver o voto como uma divergência apenas. Como mulher, negra, descendente de nordestinos e de indígenas, não posso tolerar a violência gratuita a esses grupos. Lamento quando vejo quem amo não respeitando a minha existência.

Há muitas opções de candidatos (de direita e de esquerda) que não estão colocando a nossa democracia em risco, que não vêem os Direitos Humanos e os ambientais como besteira, que não querem derramar sangue por aí. Espero que as pessoas se dividam entre eles amanhã.

Divido-me entre a esperança e o medo. Eu nunca pensei que fosse viver um momento assim e que ser brasileira seria tão complexo. Mas já que chegamos até aqui, que continuemos na luta por uma sociedade em que todos se respeitem — nem que seja minimamente.

Também escrevi sobre este assunto no blog do Clube da Escrita para Mulheres. Para ler os poemas, clique aqui.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Uma carta à Carolina de Jesus

segunda-feira, outubro 01, 2018 2
Imagem: Pezibear.
Cara Carolina de Jesus,
não queria lhe escrever sem saber nada sobre a sua obra e, de algum modo, minha consciência pesa por isso. Entretanto, quando o exercício de escrita proposto surgiu — o de escrever sobre uma outra autora desconhecida — o primeiro nome que me veio à mente foi o seu.

A primeira vez que ouvi falar da sua obra foi por uma amiga que estava lendo O Quarto de Despejo  e estava dividida entre se maravilhar com a sua literatura e se indignar com o que ela retrata. Foi essa amiga que me passou um resumo muito breve da sua trajetória de vida. Talvez tenha sido ali que eu também me dividi entre a curiosidade e o medo de te ler.

Digo curiosa porque confesso, não conheço muito da literatura escrita por mulheres negras. A verdade é que venho de uma família mista e tenho me despertado para a questão do que é ser negra agora. Foi difícil entender as regras do jogo — se é assim que podemos chamar — tendo a pele mais clara. Privilégios e a falta deles, só agora que ando atenta a tudo isso.

Carolina Maria de Jesus, em São Paulo — 1961 (imagem: divulgação).

O medo de te ler, todavia, vem da semelhança da sua história com a nossa história: minha e da vó Izabel. Sabe, a vó Izabel era a mãe do meu pai, a vó que não conheci. Ela morreu quando ele tinha 18 anos. Enfarte. Não deu tempo de socorrer. Tudo muito rápido e um tanto desesperador, como soube ano passado (quando finalmente meu pai e um tio se propuseram a nos narrar suas memórias). Cresci com um retrato da vó Izabel no quarto que então era do meu avô. Negra, alta, semblante sério no retrato de casamento. Ela era séria na vida, mas muito amada por todos. Teve muitos filhos (cinco deles sobreviveram — dentre eles, o meu pai), três empregos e um marido alcoólatra. Acho que foram esses os motivos do colapso. Quando penso em você, penso nela. Quando penso na sua história de vida, lembro-me dela. Mas também lembro de mim. Assim como você, escrevo.

Cheguei à fase adulta ouvindo que sou a neta que mais se parece com a Izabel. Isso sempre me foi motivo de orgulho. Agora, enquanto escrevo esta carta, lamento a minha covardia por nunca ter te lido (nem a você, nem a Conceição Evaristo — que também ecoa nesta epístola). Imagino que a sua obra seja um reflexo que reflita a sua vida e que, de algum modo una minha avó a mim.

Peço que você me perdoe por esta falta.
Com a gratidão que me transborda o peito,

Fernanda

Este texto foi criado a partir de uma proposta de escrita do Clube da Escrita para Mulheres. Para saber mais sobre o trabalho e como participar, clique aqui.
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