sexta-feira, 7 de julho de 2017

Sobre os livros mais vendidos no Brasil e o que eu tenho a ver com isso

Clique para ler a reportagem do Nexo.
Minha amiga, Carol Vayda, compartilhou comigo no facebook "O ranking dos livros mais vendidos no Brasil desde 2010", publicado pelo Nexoescrito por Eduardo Maschio e Rodolfo Almeida. A reportagem aponta o crescimento da leitura de literatura infantil e dos livros religiosos/de autoajuda. Junto com o link, ela deixou a pergunta: "Sis, o que acha?". 

Pois é, o que eu acho. O questionamento tão pequeno me levou à uma reflexão maior. Primeiro, arrisco a dizer que os livros mais vendidos são apenas um reflexo da nossa sociedade. O Brasil está a cada dia mais confuso politica e economicamente falando. Os escândalos de corrupção e o desemprego atestam essa confusão melhor que eu. Então, não me surpreende que no topo dos mais vendidos estejam os livros escritos por líderes religiosos (Bispo Edir Macedo e Padre Marcelo Rossi). As pessoas andam tão desesperadas que se apegam à religião, para encontrar algum consolo.

No meio da lista tem alguns livros internacionais. Alguns deles, que viraram filmes. Boa parte deles faz parte daquele grupo que recebeu investimento pesado de marketing da editoras seja junto às livrarias, seja nas ruas (aqui em São Paulo, muitos outdoors nas estações de metrô) e parcerias com blogueiros. Resumindo, uma leitura que se dá pela curiosidade gerada pelo o buzz, não porque o autor tenha necessariamente algum tipo de qualidade literária.

Nesse limbo, aparecem também os livros de youtubers e os de literatura infantil. Começando pelos de youtubers, confesso que, de todos os que li (e foram vários!), os únicos livros em que vi qualidade foram os da Bruna Vieira (talvez porque antes de ser youtuber, a Bruna trabalhava com textos no Depois dos Quinze). Contudo, se por um lado a qualidade literária da maioria deles é muito questionável (e a escrita também, já que reza a lenda que alguns fazem uso de ghostwriters), por outro é por meio dos livros dos youtubers que muitas crianças e pré-adolescentes entram no mundo da leitura. A gente sabe que o sistema educacional brasileiro tem muito a desejar e que lutar contra a tecnologia não é a melhor estratégia para fazer com que as gerações mais novas leiam, então, os livros dos youtubers ajudam a abrir as portas; ganhando, assim, algum valor. 

Sobre os livros de literatura infantil, a conversa começa em um patamar anterior. As pessoas têm mania de ver a literatura feita para crianças como algo menor. Coisa que não é verdade. Há livros de literatura infantil com qualidade literária melhor do que muitos best sellers para adultos (em que se nota que o trabalho do escritor com estrutura das sentenças, com a sequência descritiva e com o desenvolvimento da trama e dos personagens são muito mais apurados). Assim como ocorre com os livros de youtubers, a literatura infantil vem para abrir as portas para os leitores. E, nesse quesito, fico feliz que a maior parte dos livros vendidos sejam os que são voltados para as crianças e adolescentes. Quem sabe não é essa a geração que vai aumentar o índice de leitura na fase adulta mais para frente?

Esses dados me trazem uma ambivalência de sentimentos. É ótimo ver que os brasileiros estão lendo. A sensação que me dá é que o número de leitores tem aumentado ainda que a passos lentos. Isso é incrível, porque, independentemente do que é lido, é melhor estar em contato com os livros do que não ler (e é aquela história: ninguém começa de cara com um Machado de Assis. Refinamos o nosso gosto literário aos poucos. Tenho consciência de que isso é um processo). Por outro lado, me entristeço quando vejo que neste ranking não há livros maravilhosos, escritos por autores nacionais (nenhum prêmio Jabuti ou SESC de Literatura, por exemplo). Encarar esta lista como o reflexo do mercado, que por sua vez, é reflexo da cultura que prega que só o que vem de fora é melhor e que só os autores gringos têm qualidade é desolador.

E é justamente aí que eu me pego pensando no que eu tenho a ver com tudo isso.

Eu sou professora, blogueira e escritora (na maior parte do tempo, de crônicas -- um gênero consagradamente brasileiro e consequentemente menosprezado por alguns). Isso tudo me leva a pensar no meu papel, perante à sociedade, de influenciadora dos meus alunos, amigos e leitores em relação a tudo isso. É errado ler livros de autoajuda, religiosos ou de youtubers? Não, não é, e como disse acima, eu mesma já fiz isso. A questão é como levar as pessoas a irem além. Como professora a melhor forma de fazer os alunos lerem é pelo exemplo. Ler para eles, com eles, conversar sobre as minhas experiências de leitura e me interessar genuinamente pelas experiências deles é um ótimo começo. Já tive alunos que deixaram de ter a professora de língua portuguesa como modelo, para vir me pedir indicações de leituras. É nesse ponto que o meu posicionamento como blogueira e escritora entram em ação também. Se eu conheço tantos livros nacionais maravilhosos, por que vou indicar um que esteja na modinha do marketing literário? Tenho que aproveitar as oportunidades que os meus alunos e amigos me dão para fortalecer sim, a literatura nacional. 

O mesmo eu venho tentando fazer isso ao longo das minhas últimas compras. É isso que venho buscando ao longo das resenhas que trago para o blog (e me enche de felicidade saber que uma das mais lidas é a de um livro do João Ubaldo Ribeiro). Sei que é trabalho de formiguinha, mas não consigo deixar de fazer a minha parte. 

Minha esperança é que em 2020 o Nexo tenha uma lista mais promissora.
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4 comentários:

  1. Interessante seu post. Concordo plenamente e a propósito você escreve muito bem. Nós que somos da área de educação nos sentimos com essa missão de levar leituras construtivas ao maior número de crianças possível.
    Belo post!
    Bjo

    Karina Pinheiro

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    Respostas
    1. Oi, Karina!
      Obrigada pelo elogio à minha escrita! :)
      Ser da área da educação nos leva a esse tipo de responsabilidade. É uma missão complicada, mas que eu tanto gosto!
      Beijos!

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  2. Uau! Chocante o gênero religioso estar no topo. Nem tinha parado para pensar nisso, nesses dados. Acho que a maioria lê livros de YouTuber justamente por causa da grande divulgação que eles têm.
    Alguns nem são tão bons (mas todo livro é bom) quero dizer que, há aqueles que podia ser de qualquer outra pessoas, que dominou a arte de escrever e escreveu algo realmente bom, mas não. As pessoas vão correndo ler o livro deles, e está em toda parte. As editoras correm atrás deles, os fãs imploram pra eles irem na Bienal ... Se não fosse os leitores, loucos por eles, o trabalho nem seria aceito.
    Nesse mercado, eles querem o que tem certeza que irá sair!
    Beijos ❤
    Jardim de Palavras

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    Respostas
    1. Oi, Mel!
      O mercado literário ainda é muito segregador. Só entra quem tem uma boa indicação ou quem se lança independente. É complicado porque nem sempre o talento está em jogo. Sinto uma grande pena por ser assim. Espero que as coisas mudem um dia!
      Beijos :*

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Algumas Observações | Ano 17 | Textos por Fernanda Rodrigues. Tecnologia do Blogger.