domingo, 16 de julho de 2023

Onde as ruas não têm nomes

Foto que a Dani tirou de mim nas nossas andanças por Brasília.


Sou uma pessoa que gosta de mapas. Nos anos 90, quando os celulares não eram nada smart e as pessoas se viravam com o bom e velho guia de rua, eu ficava com a responsabilidade de ver onde era e como se chegava aos passeios que a turma queria fazer. Os pais das minhas amigas se sentiam aliviados por saberem que havia alguém que era quase uma bússola no nosso grupo. 

Mesmo depois da era da Internet ter se estabelecido, ainda fico com a função de guia e gosto dela. Guardo rápido os caminhos, os nomes das ruas e principalmente a direção em que as coisas estão. Nas viagens, eu continuo responsável pelo Google Maps, porque minhas amigas ainda são capazes de virar “à direita errada”. Talvez seja por tudo isso que eu tenha me sentido um tanto estranha, quando o avião aterrissou no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília. Veja bem, eu estudei o Plano Piloto durante um ano inteiro na minha graduação, sem nunca ter pisado no Distrito Federal. Sei qual é a influência barroca nas ideias do Niemeyer e do Lúcio Costa, então, quando o planejamento da viagem se concretizou, as expectativas de pôr os pés naquele chão estavam bem altas. 

Meu lado escritora, que adora enviar cartões de Natal, já havia me forçado a entrar em contato com o código postal brasiliense, ausente de logradouros — tão supérfluos para o Lúcio Costa: nada de rua, avenida, alameda, travessa. Brasília é trabalhada em código, o restante do mundo que lide com isso. 

— Fê, é só ler como na matemática. Brasília é um plano cartesiano. — Minha amiga insistia enquanto via a minha cara confusa. Segui sem compreender, enquanto acompanhava o carro se movendo no mapa do Waze, ainda perdida nos Qs, Ws, Ls e seus números. 

Naquela noite, resolvi que sairia para comprar o jantar. Descobri uma hamburgueria a 800 metros do hotel, coloquei o meu fone de ouvido e desencanei de ler o endereço. Segui na rua escura e deserta, com a mocinha do Google me dando instruções à moda brasiliense: “vire à direita na casa 38” de uma rua em que as residências não eram numeradas em sequência lógica. Dei uma volta a mais, completamente desnecessária, contudo comprei o meu sanduíche. 

O desafio veio mesmo quando tentei encontrar outra amiga no dia seguinte: 

— Me fala onde te encontrar, pego um Uber a gente se vê lá —, arrisquei em minha ousadia. Recebi o print do celular dela, com a localização: “Shis Qi 11 – s/n bl l lj 6/52. DF”. Cocei a cabeça, respirei fundo e escrevi o endereço no aplicativo. 

Mandei para ela o print com a minha tela do celular com suas seis — sim, SEIS — localizações diferentes do mesmo endereço. Como os brasilienses encontram o lugar exato da mesma quadra, eu não sei. No fim das contas, a Dani acabou indo me buscar, com medo que eu me perdesse na cidade brasileira onde as ruas não têm nome.


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2 comentários:

  1. Eu que sou residente de Brasília, já me perdi. Agora imagine você, não é mesmo?! Mas acho que a localização em Goiânia é um pouquinho pior.

    Boa semana!

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    Até mais, Emerson Garcia

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Algumas Observações | Ano 17 | Textos por Fernanda Rodrigues. Tecnologia do Blogger.