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Paraty, Rio de Janeiro. |
"O que me fez escrever foi o desejo de compreensão do mundo".
(Conceição Evaristo, 12 de julho de 2019, Casa Tag, FLIP)
"A literatura trata do que é a confusão das nossas vidas".
(Eliana Cardoso, 13 de julho de 2019, Casa Livre & Santa Rita de Cássia, FLIP)
Sabe quando você decide algo de última hora, se joga e só vai? Foi assim com a minha primeira vez na
FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty). Resolvi viajar na terça de manhã, aos quarenta e cinco do segundo tempo, quando uma amiga disse que tinha uma vaga sobrando na hospedagem em que ela iria ficar, que não era longe do centro histórico e que não estava tão cara.
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Paraty: pense numa cidade linda! :) |
Corri com tudo o que era preciso adiantar de projeto de trabalho, fiz a minha mala, coloquei os meus livros para vender na mochila e parti na quinta de manhã para Paraty, sem ter muita certeza do que fazer. Além de não ter dado tempo de pesquisar da programação (um milhão de coisas pipocando na minha timeline, porque um milhão de amigos participaram tanto da programação oficial, quanto da extra-oficial, tudo ao mesmo tempo!), também acabei não pesquisando sobre a cidade e entendendo como ela funciona.
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Antonio Prata e Djamila Ribeiro, na mesa Incorretamente Políticos, realizada na Casa Folha. |
Na chegada, encontrei a
Aline e entrei na fila com ela para ver a mesa
Incorretamente Políticos, promovida pela Casa Folha, com a Djamila Ribeiro e o Antonio Prata. Costumo brincar que o meu eu-cronista sempre vai buscar respirar o mesmo ar que o Antonio Prata, para a inspiração literária vir. Já a Djamila me instiga de outro jeito, como mulher negra que conseguiu acessar um espaço que é tão preconceituoso e de difícil entrada para todos nós, negros, que é a academia. Ouvi-la, sobretudo, me dá forças para continuar a caminhada.
O politicamente correto é um assunto que abrange complexidade com o advento das redes sociais. No Brasil, ser correto às normas [racistas, homofóbicas etc.] não é ser correto. O recalque volta como sintoma. A eficácia do termo "politicamente correto" está enfraquecida dos dois lados, porque [esse termo] é mal visto. É uma maquiagem e um tapume contra o discurso de ódio. [Me pergunto] há uma solução?
(anotações sobre a reflexão trazida pelo Antônio Prata)
A Casa Folha estava lotada, e eu achei um pouco ruim a disposição dos convidados e do público, mas deu para ouvir e anotar bastante coisa, então foi válido mesmo assim.
Lugar de fala é diferente de representatividade. A representatividade é importante. Todo mundo é localizado socialmente. O homem branco não está acostumado a se localizar socialmente. O que significa fazer parte de um lugar em que tudo gira em torno do privilégio? Lugar de fala é, portanto, uma postura ética. As consciências dos lugares sociais são um processo de construção de empatia. O processo é doloroso, é incômodo, porque muitas vezes você se vê no lugar de opressor e tem que repensar as próprias atitudes.
(anotações sobre a reflexão trazida pela Djamila Ribeiro)
Depois, voltei à
Casa da Porta Amarela para comer algo e, sem querer, acabei conhecendo a Stéfhanie, do blog
Nosso Relicário. A gente já se lia há algum tempo, então foi legal demais tê-la conhecido e me inteirar do
clube de leitura que ela modera (vamos!). Foi com a Sté que eu fui a minha volta de reconhecimento pela cidade. A ideia era ver uma mesa da
Natalia Timberman, no barco da FLIPEI, mas a programação se atrasou. Então fomos tomar um café, o que foi bacana, porque a nossa mesinha virou um mini ponto de encontro: primeiro, apresentei a Sté para a
Jarid Arraes; segundo porque encontrei a Fernanda, uma professora amiga minha, que não via há uns 10 anos, pelo menos.
Nesse ponto, cheguei à conclusão que estar na FLIP é como viver longos dias de festa em que todos os seus amigos estão juntos. Tem coisa melhor que isso?
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Socorro Acioli e Noemi Jaffe, na Casa Tag. |
No dia seguinte dormi até um pouco mais tarde e acabei pegando metade da mesa da Noemi Jaffe com a
Socorro Acioli na Casa Tag. Vi da janela mesmo (a casa estava lotada) e fiquei bem contente porque consegui perguntar a Socorro se ela virá à
Flipop desse ano
deu alívio saber que ela vem e que vou poder ouvi-la com mais calma de novo.
O conselho dado por ambas escritoras é leia muito. Leia tanto obras de outros escritores, quanto o seu próprio texto, para trabalhar a reescrita. Para Noemi, é importante que o autor brasileiro conheça a Literatura Brasileira desde os primórdios até o que é produzido na contemporaneidade. Só assim: lendo e reescrevendo, que é possível se tornar um bom escritor. Já a Socorro acrescentou que é importante saber qual é a história que só você pode contar no lugar de seguir o que está na onda da vez do mercado editorial.
(anotações sobre as falas de Socorro Acioli e Noemi Jaffe)
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Mel Duarte abrindo a mesa com a Conceição Evaristo e Jarid Arraes. |
À tarde, voltei a Casa Tag e, enquanto estava na fila para ver a Jarid mediando a mesa com a
Conceição Evaristo, vi a performance feita na rua pelas escritoras do
Slam das Minas RJ. Os poemas declamados foram tão impactantes que vale a pena passar no
Instagram delas e ver os destaques "flip 2019".
Voltando à Jarid e à Conceição, o que dizer desse encontro? Ao estar entre autoras negras me sinto como se fizesse parte de uma grande família (e faço, não?). Momentos como esse é sempre viver dentro de um eterno abraço. Tão maravilhoso! Conceição disse que
"foram os nossos que legitimaram a nossa voz", a fala dela endossa esse sentimento tão bom de ver alguém com tanta sabedoria compartilhando o que sabe (de literatura, de militância e de vida) com o público que estava ali presente.
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Conceição Evaristo e Jarid Arraes autografando na Casa Tag. |
'O discurso literário pretende mostrar o rosto de uma nação'. A literatura deve ser, portanto, completa em termos de representantes e vivências. A FLIP muda o rosto porque nós reivindicamos. (...) Nós sempre falamos, mas há vozes que falam mais alto que nós'. A autoria negra só chega à universidade com mais veemência a partir das afirmações, com acesso do público negro às universidades. Isso tem relação com as disputas de narrativa e com o medo com que nos colocamos. (...) Sendo assim, 'o nosso texto não pode ficar dentro do nosso limite. O texto de outro escritor faz parte da literatura brasileira, como o nosso [de autoria negra também faz]'. (...) 'O texto de autoria negra mostra um Brasil que as pessoas não querem ver. (...) A gente não quer colocar no branco um sentimento de culpabilidade, mas sim de responsabilidade, porque ainda são as pessoas brancas que estão no comando'.
(anotações sobre a reflexão trazida pela Conceição Evaristo)
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Retrato que fiz da americana Kristen Roupenian. |
Permaneci na Casa Tag para ver a mesa seguinte, com a escritora americana Kristen Roupenian, autora do livro
Cat Person e outros contos. Foi interessante demais para mim, que estou conectada a tantos escritores nacionais, entender como funciona o processo criativo de alguém que tem outra origem e vive outra cultura. Além de ser simpática ao extremo, Kristen relatou como lida com timidez em ter os seus textos lidos por tantas pessoas ao redor do mundo e como cria as suas narrativas.
A questão é 'O que fazer com o desconforto? Como leitora, eu gosto de me sentir desconfortável'. Portanto, o processo criativo se dá a partir de algo ou de uma situação que instiga, que provoca, não a partir de um tema específico. Há histórias que nascem das duas formas: mais estruturadas, planejadas (mesmo que seja um planejamento apenas mental) e outras surgem de modo mais espontâneo.
(anotações da fala da autora Kristen Roupenian)
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Estava tão fan girl que não tirei foto com a Lili.
Segue a dedicatória cheia de amor que ela me fez, deste livro que já estou devorando. |
Saindo da Kristen, fui tomar café com a Aline. Depois disso, voltei à Casa da Porta Amarela e lá conheci a
Liliane Prata, que autografou o seu lançamento mais recente para mim,
O mundo que habita em nós. Eu dei um exemplar do meu
A Intermitência das Coisas para ela. Esse foi, sem dúvida alguma, o meu momento
fan girl da FLIP, porque eu acompanho a Lili há muito tempo e foi legal dizer a ela o quanto tenho curtido o podcast (
Proibido Fritar Pastel) e o quanto ainda estou impactada pelo episódio de estreia sobre o nada
(ouçam e tirem as suas próprias conclusões!).
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Talita Taliberti, do KDP, a escritora Eliana Cardoso e a editora Janaina Senna, da Nova Fronteira. |
O meu terceiro dia de FLIP, começou na Casa Libre e Sta. Rita de Cássia, com a mesa da Eliana Cardoso, vencedora da 3ª edição do Prêmio Kindle de Literatura e a Janaina Senna, editora da Nova Fronteira. Eliana venceu a premiação com o romance
Dama de Paus, que narra um assassinato e um suicídio numa cidade fictícia do noroeste de Minas Gerais.
Durante a mesa, Janaina contou como funciona o processo de seleção da obras do Prêmio Kindle desde a inscrição no KDP até a publicação da obra (inscrições para o prêmio deste ano entre 15 de agosto a 15 de outubro,
saiba mais aqui). Já a Eliana compartilhou de forma muito fofa como é o processo de escrita dela e o que é preciso para ganhar a premiação.
Na ficção, a ideia nasce mais desordenada, por isso é importante ter um arco narrativo. Também é necessário estar aberto às críticas dos leitores e dos editores e ler, ler muito. Aceitar o que o editor diz e fazer os cortes e adaptações necessários são impressindíveis para tornar o livro melhor. Indicação de leitura: O tempo envelhece depressa, de Antonio Tabucchi.
(anotações sobre a fala da escritora Eliana Cardoso)
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Poesia em outras margens, com Flávia Péret e Dennis Radünz. |
Uma pausa para o almoço e, depois disso, caminhadinha com direito a sorvete e fotos pela cidade na companhia da Sté. Foi nessa voltinha que acabamos entrando no SESC (Unidade Santa Rita), e vendo o café literário "Poesia em outras margens", com Dennis Radünz e
Flávia Péret. Pensem na grata surpresa. A Flávia, além de poeta, dá aulas de escrita criativa e vê-la compartilhando os seus conhecimentos como docente me trouxe muitas ideias para as oficinas de escrita criativa que eu leciono. Já o Dennis estabeleceu o paralelo entre a literatura e as outras formas de arte.
"Poesia tem muito mais relação com artes visuais, com música, do que com literatura, com muitas aspas na palavra literatura. (...) Quando a gente está falando de poesia ou de artes visuais, a gente está falando de política".
(Fala de Dennis Radünz sobre o fazer poético)
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Praia do Pontal, Paraty, Rio de Janeiro. |
Já era o meio da tarde quando eu resolvi descansar um pouco. Estava exausta, cada amigo estava com uma programação diferente, e eu percebi que não conseguiria mais acompanhar nada de tão cansada. Então fiz o melhor que podia: caminhei até a praia, me sentei em uma das pedras, e passei boa parte da tarde contemplando a natureza. Há tempos não fazia algo assim e me reconectar com a essência foi ótimo para me reenergizar.
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Sarau no barco Embarque na Poesia. |
Tinha planejado mais um sarau e uma mesa para o sábado à noite, entretanto, o frio me pegou de um jeito que, mesmo de casaco, comecei a passar mal. Fiquei triste de ter que sair no meio do sarau, porque três amigos meus estavam apresentando os seus poemas, mas senti que tinha que respeitar o meu corpo. Sendo assim, voltei, tomei um banho quente, depois fui comer e dormir para aguentar a viagem de volta no dia seguinte.
Apesar de inesperada, a minha primeira Flip foi bacana. Ainda que não tenha ido com o propósito de vender os meus livros, consegui fazer algumas vendas, o que me deixou feliz por ter feito parte do evento também como autora. Ao voltar para casa, vi que a
lista dos livros mais vendidos foi composta por negros e indígenas em sua maioria, o que é um marco para o mercado editorial brasileiro. Além de ser uma conquista e tanto para todos nós, dá orgulho de ter uma amiga ali no meio!
Enfim, a Flip foi um bom presente de férias. Agora, que venha a edição do ano que vem!
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Ah! Para quem quiser ver boa parte desses momentos, acesse os
stories do meu Instagram, no destaque FLIP 2019.
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Ah, que post incrível!
ResponderExcluirQue chique você vendendo livros na FLIP!
Fe, adorei o formato do post. Gosto super de me sentir andando com a pessoa durante o texto como se eu estivesse lá.
Achei muito legal isso de anotar o que os autores falam, como eu nunca fui em feiras literárias, não fazia idéia disso. Vou guardar a dica pra Flipop!
Adorei o post, as fotos, as reflexões.
Um beijo!
Oi, Line!
ExcluirQuem sabe a gente não vá juntas à Flip do ano que vem?
Fica aí o convite!
Que bom que o formato do post funcionou. :) Fico feliz!
Um beijo!
Oi, Fernanda! Que maravilha de envento não é? Eu, apesar de ser carioca da gema, só estive em Paraty uma única vez, lembro-me que o evento foi sensacional naquele fatídico ano de 2001, de lá para cá, não tive mais oportunidades de ir até Paraty, até porque não é tão perto assim da capital. Mas, enfim adorei as fotos e o evento que tenho certeza de que foi maravilhoso não é mesmo? Parabéns pelo lançamento de seu livro o "A intermitência das coisas", adorei o título de seu livro, o achei bem atraente e chamativo. Muito bonita as fotos que tu escolheste para mostrá-las aí em seu blog para nós leitores. Um forte abraço!
ResponderExcluirhttps://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com
Oi, Luciano!
ExcluirObrigada pelas palavras. A viagem é longa mesmo. Tem que ir sem pressa, pra evitar que o cansaço se triplique. Espero que você possa voltar a Paraty em breve, porque a cidade é realmente bonita. :)
Quanto ao meu livro, espero que você tenha a oportunidade de comprá-lo e lê-lo em breve. Será uma honra.
Um beijo!
AMEI seu post! Paraty é uma cidade maravilhosa e quero mt voltar e ter a oportunidade de participar de uma FLIP tbm
ResponderExcluirwww.tofucolorido.com.br
www.facebook.com/blogtofucolorido
Vaaaaaaaaaamos, Liv!
ExcluirJá quero voltar no ano que vem! :)
Fico feliz que tenha gostado do post.
Um beijo :*
awesome article..
ResponderExcluirthanks for sharing
You're welcome! :)
ExcluirEssa viagem deve ter sido a coisa mais incrível da vida, fiquei encantada com as suas fotos!
ResponderExcluirhttps://www.kailagarcia.com
Foi bem intensa mesmo! :) Valeu a pena, apesar de ter sido bem corrida.
ExcluirObrigada por comentar. Fico feliz que tenha gostado das fotos ;)
Beijos
Que delícia que deve ter sido, hein? Sou doida para conhecer essa cidade! ^^
ResponderExcluirBeijo.
Cores do Vício
Oi, Pathy!
ExcluirÉ longe, mas vale a pena. Tente ir, porque você não vai se arrepender.
De dica, já digo pra ir com sapato bem confortável, se não complica pra andar.
Um beijo!
Essa cidade deve ser maravilhosa
ResponderExcluirwww.achatadebatom.com
É sim!
ExcluirVale a pena a visita.
Um beijo!
Deve ter sido uma experiência inesquecível! :) Beijinhos
ResponderExcluir--
O diário da Inês | Facebook | Instagram
Ah, sim!
ExcluirO Brasil é muito imenso. São muitos lugares incríveis para conhecer. ;)
Um beijo :*
Que viagem legal, parece ter sido incrível. Uma bela experiência né!
ResponderExcluirEsse evento é bem conhecido né? Que bom que teve a oportunidade de participar ♥
https://www.heyimwiththeband.com.br/
O evento é o principal de literatura na América Latina. Fiquei feliz demais por ter ido! :)
ExcluirUm beijo!
Ai gente! Babei nessas fotos e na experiência.
ResponderExcluirEsse ano eu vou na Bienal...
Beijos
https://balaiodebabados.blogspot.com/
Espero que você se divirta!
ExcluirUm beijo :*
Parece que foi um evento muito interessante.
ResponderExcluirBom fim de semana!
Jovem Jornalista
Fanpage
Instagram
Até mais, Emerson Garcia
Sim, foi incrível!
ExcluirUm beijo!
Oi Fernanda,
ResponderExcluirSeria um sonho participar da FLIP!
Quero ver se consigo me programar para ir, pelo menos um ano que seja.
beijos
http://estante-da-ale.blogspot.com/
Oi, Alê!
ExcluirVale a pena :)
Prepare um sapato confortável e vá!
Um beijo!
Nossa que passeio gostoso e cheio de conhecimento, que delícia. Gostei demais. É tão bom encontrar pessoas e ter essa troca rica de informações a respeito de um universo que amamos né? ♥
ResponderExcluirCharme-se ♡
Siiiiiim! Eu adoro! :D
ExcluirUm beijo :*
Que momento bom! Pelo relato parece que foi uma viagem incrível!
ResponderExcluirÓtimo post!
Blog da Juh
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A viagem foi maravilhosa mesmo!
Excluirum beijo :*