Misturando a realidade de seu antepassado, a história da chegada da gripe espanhola no Brasil e ficção, Wagner G. Barreira, tece uma trama envolvente para nos apresentar a vida de Bernardo, um espanhol nascido na Galícia, que passa boa parte da vida em Vigo, cidade onde vive de forma errática.
Órfão de pai e mãe, Bernardo foi deixado em um orfanato para ser padre. Ali, ele sofre todos os possíveis maus tratos e resolve seguir outro rumo que não o do sacerdócio. Nas ruas de Vigo, ele aprende o que é sexo, amor, bebidas, jogos, trapaças e contrabando, se tornando bem quisto por uns e odiado por outros. É em meio da desilusão com a vida que Bernardo recebe um chamado: embarcar no navio Demerara rumo a Buenos Aires.
A princípio Bernardo resiste. Largar a vida para se apegar a uma promessa não parece algo que lhe faz sentido. Depois, com o desenrolar da trama, ele aceita o convite, cruza o Atlântico e acaba desembarcando no Brasil. Nada é como Vigo, nada é como a árvore que sempre lhe dera olivas. Ainda mais quando se traz na bagagem a doença estranha, que ninguém sabe bem como se trata. E isso é tudo para prender o leitor página a página, capítulo a capítulo.
O livro é estruturado em 18 capítulos ágeis em ações e com detalhes na medida certa. Wagner G. Barreira traz consigo o seu lado jornalista: os fatos são apresentados com clareza cristalina. Os diálogos são precisos. A prosa é arrojada. Meu eu leitora seguia página a página sem desgrudar do gancho literário que cada cena criou no meu imaginário: uma Santos sitiada, uma São Paulo em expansão. Conforme Laurentino Gomes nos aponta em seu prefácio, Wagner G. Barreira fez uma pesquisa intensa sobre o contexto histórico da obra, portanto as descrições são muito fiéis ao Brasil de 1918.
Assim como aconteceu com as nossas vidas durante a pandemia de COVID, a vida de Bernardo foi marcada pela gripe espanhola. Há uma identificação nossa com a desse sobrevivente que também teve medo, que também viu pessoas morrendo de perto. Essa carga da vivência emocional de Bernardo nos coloca em um lugar de refletirmos sobre a nossa própria vivência em tempos tão difíceis e em como recomeçar depois que as ondas das doenças se vão. Literatura e realidade em simbiose, mais uma vez.
capa
Livro: Demerara
Autor: Wagner G. Barreira
Prefácio: Laurentino Gomes
Gênero: Romance
Páginas: 152
Editora: Instante
Apresentação/Sinopse: O romance de estreia de Wagner G. Barreira conta a trajetória do jovem Bernardo, que embarca no navio que trouxe a gripe espanhola para o Brasil — e dá nome ao livro.
Bernardo nasceu na Galícia, no norte da Espanha. Ainda criança foi para um orfanato na cidade de Vigo, onde estudou e perdeu a chance de se tornar padre. Em 1918, dois anos após deixar a instituição, leva uma vida errante, vivendo de pequenos golpes ao redor do porto. Convencido por um amigo e precisando desaparecer por um tempo, embarca no vapor Demerara a caminho da América do Sul, na mesma viagem que trouxe a pandemia de gripe espanhola para o continente.
Mistura de ficção e eventos históricos, o livro de Wagner G. Barreira dá voz ao narrador personagem ao relatar a travessia do Atlântico, a acusação de ter assassinado o amigo, a prisão em Santos, a convivência com infectados pelo vírus, a fuga para São Paulo e as dificuldades de adaptação na cidade em construção pelas mãos de imigrantes de todo o mundo.
Demerara nasceu a partir de conjeturas sobre as origens do avô paterno de Barreira. De Bernardo, o protagonista e narrador, pouco se sabe de fato: era galego, chegou ao Brasil no navio Demerara e morreu no dia do batizado do único filho. Fora esses três fatos, tudo mais é ficção, tentativa de recriar a vida do antepassado a partir do ponto de vista do escritor, que fez uma abrangente pesquisa sobre os fatos históricos do período.
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Fernanda Rodrigues é uma paulistana apaixonada por gatos e café. Atualmente é professora de escrita literária, escritora, revisora, preparadora de textos, leitora crítica, assistente literária, palestrante e cofundadora do Projeto Escrita Criativa. De formação, é especialista em Psicopedagogia, (Anhembi-Morumbi), em Docência em Literatura e Humanidades (FMU) e em Formação de Escritores e Produção e Crítica de Textos Literários (ISE Vera Cruz), além de ser bacharel e licenciada em Letras — Português/Inglês (USJT) e pós-graduanda em Revisão de Textos (FMU). É autora dos livros de poesia A Intermitência das Coisas: sobre o que há entre o vazio e o caos (2019) e Rasgos dentro da minha própria pele (2022), ambos publicados pela Editora Litteralux (antiga Penalux), de La intermitencia de las cosas: sobre lo que hay entre el vacío y el caos (2024), publicado pela Caravana Editorial e do didático Narrativas Digitais: narro, logo existo! Registrar o meu mundo e construir histórias (2021), lançado pela Fundação Telefônica Vivo. É 3º lugar no Prêmio SESC Crônicas Rubem Braga (2017) e tem textos em diversas antologias. Também escreve no site Algumas Observações, no ar desde junho de 2006.
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Desde 24 de novembro de 2013, as imagens do Algumas Observações são de minha autoria. Anteriormente, as que aparecem nas postagens eram meramente ilustrativas. Na maior parte das vezes, elas foram retiradas do Google Imagens, do We ♥ It e/ou do Tumblr. Evidentemente, sempre que eu sei quem é o autor, dou os devidos créditos. Entretanto, se você viu alguma imagem de sua autoria, por favor, deixe um comentário ou entre em contato avisando para ser creditado ou ter sua imagem substituída. ;)
Parece ser uma leitura fabulosa.
ResponderExcluirBoa semana!
O JOVEM JORNALISTA está no ar cheio de posts novos e novidades! Não deixe de conferir!
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Até mais, Emerson Garcia
E é! :)
ExcluirOi, Fernanda! Como vai? Parece um livro interessante e instigante, né? Que bom que curtiu a leitura. Muito boa a resenha. Abraço!
ResponderExcluirOi, Luciano!
ExcluirEu acho que você iria gostar dessa leitura. Obrigada pelo elogio ao meu texto.
um beijo