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Anna Clara de Vitto e o seu Água Indócil, no dia do lançamento da obra.
Imagem: blog da autora. |
Água Indócil é o livro de estreia da escritora santista Anna Clara de Vitto e traz à tona uma poesia que, assim como o mar revolto, traga o leitor para dentro de seus versos de forma arrebatadora.
A obra está dividida em três partes: Águas Abrigadas, Ressaca e Vento Noroeste. Nas águas abrigadas, vi muito da formação da personalidade da poeta. Desde menina, até a fase adulta: todas as experiências que lhe permearam a construção de quem esse eu-lírico é atualmente.
"o mar cerrou as portas"
(Verso do poema "Primeiras palavras" / página 20).
Vemos ali a formação da poeta como fruto do autoconhecimento; que, por sua vez, resulta da absorção do externo para um mergulho interno. Como se o mar só fosse reabrir as portas quando o eu-lírico se redescobrisse. Nessa busca por uma identidade, é possível que o leitor se depare com temas bem atuais, a exemplo da procura pela felicidade em tempos de liquidez. De certo modo, poeta leitor e mundo fundem-se em atitudes cotidianas, conforme traduz o poema "Arrebentação" (página 22):
"procuro inutilmente
na fotografia recém tirada
um pedaço de felicidade
sobrevivente"
Ainda nas águas abrigadas a poeta demonstra a destreza que tem ao manejar a língua, ao escrever o poema "coronel Agenor de Camargo, 314". Ali, o trabalho com a mistura de gêneros desloca o leitor para a cena e a torna tão contundente para ele quanto é para o eu-lírico que a vive.
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Com a Clarinha. Foto do dia do lançamento do Água Indócil. |
A maior parte dos meus poemas preferidos estão no segundo trecho, a Ressaca. É no miolo da obra em que vemos a imigrante, aquela que vem à capital e traz o mar consigo. Nesse bloco, vemos o lado de alguém que vive o não-lugar, que se adéqua sem se adequar: a rotina do metrô, a frieza das construções, as relações que não se relacionam.
"não foi possível evitar os desastres
com as pontas dos dedos
apago teus restos
entre as minhas pernas"
(Poema "Cidade sitiada" / página 57)
Segundo a própria autora, o vento noroeste é um vento que traz muitos desconfortos aos santistas. Sendo assim, cabe a última parte do livro falar sobre temas mais incômodos à poeta, de protestos. É ali que toda a ira desse eu-lírico vem à tona, nos provoca, nos tira do nosso lugar de conforto.
"parto porque é precisoparir"(Poema "par(t)ida III" / página 84)
Ler o Água Indócil é ganhar novas perspectivas do que é a poesia e do que é ser mulher. Como toda vista do mar, passamos do tranquilo ao arrebatador em fração de segundos e é esta força que é bela.
Livro: Água Indócil
Páginas: 98
Apresentação: Como o mar, as imagens destes poemas são ondas que molham nossos olhos de nostalgia, água salgada que enche nossas bocas. São ondas rebeldes que ameaçam destruir todas as estruturas. Poemas que nossos corpos suportam porque conhecemos as pancadas. Anna Clara de Vitto não escreve águas fáceis e doces. Memória e morte dialogam com uma menina e com uma mulher que trocam olhares compreensivos. Sabem uma da outra. Contam histórias difíceis, mas que na estética e no toque de Anna Clara de Vitto revelam uma grande beleza. Neste livro, afogar-se e naufragar é desejável. Não há razão para temer. O momento de voltar a superfície chega. E com ele, a resiliência. Poemas políticos, punhos fechados de mulher. Escrita ferina. Então, toda a trajetória se fecha perfeitamente em uma obra coesa. Anna Clara de Vitto tem um trabalho excelente. Está a frente do Clube da Escrita Para Mulheres, coordenando exercícios de escrita que incluem centenas de mulheres que escrevem ou desejam começar a escrever. Sabe como transformar pequenas palavras em grandes universos imagéticos. Sua estética poética comprova: cada um de seus poemas é exatamente o que precisa ser. Água indócil prova muitos pontos. Entre eles, o de que toda lembrança, assim como toda dor, se lava. E vira luta. (Jarid Arraes)
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Olá, Fernanda! Belíssima indicação. Sua resenha ficou ótima. Eu amo ler livros poéticos, sendo assim já anotei este. Abraços!
ResponderExcluirhttps://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com/
Oi, Luciano!
ExcluirEspero que você goste. A Clarinha é uma escritora de mão cheia e uma pessoa incrível.
Um beijo