segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Carta a Paulo Mendes Campos

Paulo Mendes Campos / Reprodução.

Caro Paulo Mendes Campos,

Já amei e não fui correspondida. Muitas vezes. Arrisco dizer todas elas. Sim, em trinta anos amando, em nenhuma das vezes fui correspondida. É loucura ou azar – cada um dá um nome, você pode escolher o seu – mas, independentemente de como nomearmos, a solidão é um fato na minha vida.

A forma como lidar com isso oscila: ora estou bem, autossuficiente, uma diva em pleno poder; ora estou no fundo do poço, na carência excessiva, no caos e na dor de quem sofre por estar só e por sentir pena de si mesma. É oito ou oitenta. Não tem jeito.

Foi em uma noite dessas, em meio à uma dessas crises de desamor, que nos (re)encontramos: você e eu. Estava na pós-graduação, na aula de crônica; e, depois de muito falar sobre o Vinícius de Moraes, lá veio você, me dizer, com todas as letras, que o amor acaba.

Eu acho que já conhecia esse seu texto. Tinha lido na adolescência, em alguma aula sobre prosa poética do Ensino Médio. Passado que piscou como um flash, já que o objetivo daquela época era falar de tudo rapidinho para focar na dissertação argumentativa dos vestibulares. Te conheci na adolescência, mas só agora eu pude compreender a magnitude de uma frase tão singela quanto a que intitula o seu texto. “O amor acaba”. Três letras. Quanta sabedoria.

A aula da pós aconteceu em uma quinta-feira gelada de outono e retomava a questão da prosa poética. Eu cheguei ali, alheia a dor, achando que havia me blindado. Então, lá veio o professor, começando a te ler, com a voz a enchendo a sala e o sentidos de quem ouvia as suas palavras. Lá fui eu, me entregando, me inundando por você, pela dor do arrebatamento de saber que aquilo que eu sempre quis é tão frágil, tão volátil. Será que há alguma forma de não acabar com a esperança?

Eu sei, Paulo, que os tempos são outros. E é justamente isso que me assusta, me faz encolher quase em posição fetal, chorando por dentro. Se na sua geração — a que andava nas ruas, conversava nos bares e se reunia para discutir literatura, música e arte —, o amor já acabava de forma tão singela; você consegue imaginar na minha, em que as pessoas mal se olham, presas ao imediatismo das telas de um celular?

Quando o professor chegou ao fim do texto, estava com os olhos embargados e com um aperto incomum no peito. Precisava de um abraço, de um aconchego que só este amor, que um dia acaba, poderia me dar. Naquela noite, tentei chorar e não consegui.

Ainda não sei. Talvez, lá no fundo, eu não acredite que exista amor, mesmo querendo um... Talvez meu impulso seja duvidar de você, seja de lutar contra o fim do amor que acaba. Por que a vida é tão complicada, Paulo? Você já chegou a alguma conclusão sobre isso?

Certezas não tenho e por isso, me despeço.

Um beijo de quem se fechou na luta para não desistir,


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8 comentários:

  1. Oi! Poxa, me identifiquei demais no trecho do oito ou oitenta hahaha
    E ah, que texto lindo! Amei o post e o jeito tão genuíno de escrever <3

    Beijos,
    ahamare.blogspot.com

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    1. Oi, La!
      Fico feliz que você tenha gostado tanto :)
      Ser 8 ou 80, quem nunca?

      Beijos!

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  2. Às vezes, também penso que não existe o amor. Mas aí eu lembro de todo amor que já recebi em vários momentos. Amor que é gentileza, suavidade, troca, entrega. Ele começa, acaba e recomeça. Diversas vezes. Com diferentes pessoas. É difícil. É triste quando acaba. Mas pode ser mais simples do que o nosso desejo exige ;)

    Adorei, viu!

    beijos!

    https://ludantasmusica.blogspot.com.br

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    1. Eu vejo o texto do Paulo. Tento desistir, mas não consigo. De qualquer forma, ele retrata esta gentileza, suavidade, troca e entrega que você disse. Talvez seja por isso que é tão lindo! ♥

      Fico feliz por ter gostado :)
      :*

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  3. Que texto lindo.... fiquei até sem saber o que dizer. Já tive amores que passaram, mas acho que consegui encontrar muitos que viverão por muito tempo...Para mim, o mais importante é que seja intenso, mesmo que não dure.

    Dani Ramos
    http://donaengenhosa.com.br/

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    1. É engraçado isso: cada um tem um ponto de importância. Pra mim, a honestidade é o principal. Os dois têm que saber se está funcionando e dizer quando não está. Assim, dá pra tentar organizar as coisas. Se chegar ao fim, pelo menos os dois sabem dos esforços que fizeram.

      Fiquei feliz por você ter gostado e por ter expressado a sua opinião aqui. :)

      Beijokas!

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  4. Adoro sua forma de escrita, gostei de mais. Textão da porra!
    beijos

    http://www.cherryacessorioseafins.com.br

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